Cresce o número de pedidos de Recuperação Judicial; entenda o que é esse processo
O especialista em Recuperação Judicial, Rafael Abreu, explica que em 2020 as empresas puderam contar com uma compreensão maior dos fornecedores e com a interferência do Governo, o que não está ocorrendo agora
A pandemia da Covid-19, que já se estende há mais de um ano no Brasil e no mundo, trouxe consequências negativas nos mais diversos âmbitos. Colapsos nos sistemas de saúde, números de óbitos diários pela doença superando 4 mil, famílias inteiras sendo dizimadas. Por outro lado, empresas em dificuldades, outras fechando suas portas, demissões em massa, famílias sem renda, aumento do endividamento e da fome. O país vive um caos e os especialistas das mais diversas áreas são unânimes ao afirmar que a situação só deve começar a voltar à normalidade com a vacinação chegando à maioria da população.
Um dos setores mais afetados pela pandemia da Covid-19 tem sido o empresarial. Com sucessivas semanas de isolamento social rígido e outras com horário de funcionamento reduzido, o comércio tem amargado muitas dificuldades. Boa parte das empresas que não precisaram fechar suas portas, tem buscado soluções para não ter que encerrar seus negócios, seja com readequações, seja com abertura de processos como a Recuperação Judicial. Esse tipo de solução teve um aumento considerável no país nos últimos meses. De janeiro para fevereiro, houve um crescimento de 83,7% nos pedidos de recuperação, segundo dados divulgados pela Serasa Experian. O número de requerimentos de fevereiro também é 11% maior em comparação ao mesmo mês do último ano.
Dos 90 pedidos no último mês, 71 foram de micro e pequenas empresas. Já são 139 pedidos em 2021. Com a aceleração, há expectativa de atingirem o mesmo patamar de 2016, quando 1.865 empresas pediram recuperação em meio à recessão ocasionada pela crise política e econômica.
Até o fim do último ano, os números de pedidos eram baixos. As recuperações judiciais tiveram queda de 15% em 2020. No último mês de novembro, os pedidos atingiram o menor número desde 2013 — apenas 52.
Assim, o crescimento súbito sinaliza uma demanda represada, que já era, de certa forma, até prevista. Em 2020, com a crise de Covid-19, as empresas puderam contar com uma disposição maior do mercado para renegociações de dívidas e prorrogações de prazos. Além disso, houve interferência do governo, com flexibilização de regras trabalhistas, controle dos juros e pagamento do auxílio emergencial, que manteve o consumo. Mas a duração prolongada da crise sanitária causou o esgotamento desses incentivos.
O especialista em Direito Empresarial, Recuperação Judicial e Turnaround, Rafael Abreu, que já participou de inúmeras reestruturações e conduziu diversas recuperações, explica que esse direcionamento das empresas para a recuperação já era um movimento esperado em 2021, com a redução da compreensão do mercado e das medidas de apoio do Governo e “saber o momento certo de tomada de decisão é o segredo do êxito desse tipo de processo, pois quanto mais rápido forem implementadas medidas administrativas e judiciais para reequilibrar as dívidas e defender o fluxo de caixa, sem, contudo, prejudicar o dia a dia da empresa, maiores serão as chances de reerguimento”, explica.
No final do ano passado, o Senado aprovou, o texto principal do Projeto de Lei 4.458/2020, que reformula a Lei de Falências. Entre outras medidas, a proposta aprovada amplia o prazo para o pagamento de dívidas tributárias. A ideia dos autores do projeto foi dar mais agilidade aos processos de recuperação judicial.
Além disso, agora também permite que o devedor em recuperação judicial tenha a possibilidade de firmar contratos de financiamento, inclusive, dando seus bens em garantia, além dos bens da própria empresa (maquinários, terrenos, prédios, veículos), por meio de alienação fiduciária (uma espécie contratual destinada à compra e venda de bens imóveis ou de bens móveis), o que antes não era possível.
“Acredito que as empresas que já estavam em dificuldade econômica e muito mais agora, por conta do agravamento da pandemia e sucessivas ampliações do isolamento social rígido, pensarão mais rápido em entrar em recuperação judicial porque precisam tomar uma atitude em prol da manutenção dos negócios e poderão usufruir de alguns benefícios dessa nova lei. Um último ponto, que exemplifica essa vantagem do novo momento da lei seria que, na recuperação extrajudicial, surgiu a possibilidade ainda de incluir débitos trabalhistas, desde que haja uma negociação prévia com o sindicato da categoria. Isso não existia anteriormente e facilitará, sobremaneira, a vida das empresas”, conclui Rafael Abreu.