Sem debate, projetos de lei interferem na gestão do setor de alimentação fora do lar
O mais recente se tornou lei e interfere no cardápio dos bares, restaurantes e similares
No Ceará, há uma lista de projetos que já foram apresentados nas casas legislativas, que se aprovados trariam pequeno ou nenhum efeito prático, mas que causariam grande impacto ao setor de alimentação fora do lar. Água de graça, desconto para pessoas que fizeram cirurgia bariátrica, espaço exclusivo em bares para mulheres amamentarem, obrigatoriedade de construir uma pia a cada 60 metros dentro dos estabelecimentos, estes são apenas alguns dos exemplos de propostas que ocuparam a tribuna das Câmaras Municipais e Assembleia Legislativa, elaboradas sem o devido debate com o setor.
A mais recente, esta sim aprovada pela Assembleia Legislativa do Ceará e sancionada pelo governador do estado, exige que restaurantes, bares e similares informem aos clientes os produtos comercializados que contêm substâncias que causam alergia: glúten, lactose, leite, peixe, amêndoas, corantes, castanhas, soja, ovo e crustáceos. A informação deve constar no cardápio, ao lado de cada produto, discriminando os itens utilizados. No caso dos estabelecimentos com self-service, o aviso deve estar na etiqueta de identificação do alimento.
A Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel) entende que estas são claras tentativas de o poder público interferir na operação dos estabelecimentos. Na visão da entidade, a medida é inconstitucional, pois fere o direito à liberdade econômica expresso no artigo 5º, inciso XIII, da Constituição Federal.
“Sabemos que muitas vezes o deputado ou vereador que propõe a lei está até bem intencionado, mas é preciso lembrar que o legislador é um representante do povo, e que é preciso ouvir o setor, entender a fundo como ele atua, para só então propor uma mudança que trará grandes impactos (estruturais, financeiros e outros) e muitas vezes pouquíssimo benefício”, diz o presidente da Abrasel no Ceará, Taiene Righetto.
Righetto acrescenta que é inviável atender a lei, já que praticamente todas as preparações de um restaurante podem causar algum tipo de alergia alimentar, já que há sempre o risco de um alimento ter traços de um alergênico por contaminação cruzada, mesmo que o ingrediente não faça parte do prato. “Em geral, os restaurantes já informam para os consumidores que há traços de alimentos alergênicos, e o próprio cliente, que já conhece seu grau de alergia, pode decidir conscientemente que lugares frequentar e que pratos consumir sem prejuízo a sua saúde. É por isso que, pensando em públicos bem específicos, já existem estabelecimentos criados para atender uma demanda crescente, seja de quem tem alguma alergia ou intolerância, ou mesmo quem adotou novos hábitos de vida, como vegetarianos, veganos ou quem não consome mais açúcar”, afirma.